A disfunção sexual apresenta múltiplos fatores causadores e a dor crônica pode agravá-la se não tratada adequadamente.
Pessoas com dor crônica apresentam outras comorbidades associadas a sua condição como por exemplo:
- distúrbios do sono;
- depressão;
- ansiedade.
As emoções e a dor estão fortemente conectadas.
Os transtornos dolorosos dificultam a dinâmica familiar e dos casais, diminuem a disposição dos pacientes ao diálogo e o fragilizam emocionalmente.
Pacientes entram em conflitos com sua vida antes da dor e sua vida atual, com dor crônica, o que gera dificuldades de se integrar com o seu parceiro (a).
Além do aspecto da dinâmica social, encaramos outro problema, qualquer medicamento utilizado cronicamente pode apresentar algum efeito colateral indesejável.
Geralmente, nós médicos acabamos nos focando em explicar aos pacientes se o remédio vicia, dá sono, aumenta ou não o peso ou causa constipação. E colocamos de lado os seus efeitos sobre a função sexual.
Não existem muitos estudos sobre o tema dor e disfunção sexual especificamente. Mas os nossos medicamentos são utilizados para outras doenças como a depressão, ansiedade e epilepsia e para estas doenças existem diversos estudos sobre o tema.
Muitas drogas utilizadas do tratamento da dor crônica podem causar disfunção sexual, hipossexualidade, hiperssexualidade e diminuição da libido e distúrbios ejaculatórios.
Essas queixas não recebem a devida atenção, seja por vergonha do paciente em relatá-las ou pela falta de uma comunicação adequada entre o médico e o paciente.
Os efeitos colaterais dos medicamentos podem impactar negativamente no tratamento dos pacientes e, devem sempre serem relatados para que, alternativas farmacológicas, possam ser utilizadas.
Vale lembrar que nem todos os pacientes irão apresentar os mesmos efeitos colaterais e eles geralmente são relacionados a dose dos medicamentos a ser utilizados. Ou seja quanto maior a dose maior a chances de efeitos adversos.
Quais medicamentos podem causar disfunção sexual na dor crônica?
Os anticonvulsivantes, são muito utilizadas no tratamento da dor crônica geral, seja nas dores neuropáticas, dor lombar, dor ciática, enxaquecas ou cefaleias, podem estar relacionados a estes efeitos indesejáveis.
As drogas com mais chances de diminuição da libido dos medicamentos utilizados para dor nesta classe são:
Carbamazepina: pode causar alterações de funções hormonais quando utilizado cronicamente, no mundo da dor crônica, vinculamos o seu uso ao tratamento da nevralgia do trigêmio;
Fenitoina: não é primeira escolha dos tratamentos dolorosos, mas pode ser utilizados nas crises de dor facial trigeminal e como terceira escolha em alguns casos de dor trigeminal;
Ácido Valproico: pode causar disfunção erétil nos homens, por modificar o metabolismo dos hormônios androgênicos, seu uso está relacionado ao tratamento das enxaquecas, como medicamento de primeira linha. Em mulheres jovens em idade fértil, seu uso deve ser cauteloso, já que o medicamento também é considerado teratogênico, ou seja pode causas malformações no feto em mulheres grávidas, sendo um medicamento proibido nesta populacao de mulheres ou descontinuado quando a mulher tem a intenção de engravidar!
A hipossexualidade (anorgasmia e diminuição da libido ) pode ser causada quando altas doses de gabapentina são utilizadas, o seu uso está relacionado ao tratamento das dores neuropáticas em geral, como por exemplo na neuropatia diabética dolorosa.
A hiperssexualidade (aumento da atividade sexual de forma obsessiva) pode estar relacionada a altas doses de lamotrigina, anticonvulsivante que geralmente é utilizado como terceira linha de tratamento da dor neuropática.
A disfunção erétil ( impotência sexual) pode estar relacionada ao uso de topiramato, pregabalina e gabapentina.
Vale lembrar que todo efeito colateral de medicamento é dose dependente, sempre podendo ser diminuída a dose antes da sua suspensão, se este fármaco for essencial a sua condição.
Se fármaco não for tolerado, não tenha vergonha de relatar ao seu médico o que está acontecendo, para ele poder identificar se é realmente o medicamento em questão está causando este efeito, ou existem outras condições emocionais ou fisiológicas, que estejam impedindo o seu desempelho sexual. Assim ele irá conseguir buscar uma alternativa segura a sua condição e encaminhá-lo a outros especialistas se for o caso.
Em relação aos psicofármacos, os antidepressivos que são utilizados na dor crônica, duas classes de antidepressivos: os tricíclicos e os duais (ação serotoninérgica e noradrenérgica), exigem cuidado e atenção.
Dos tricíclicos, a clomipramina, e dos duais, e a venlafaxina, têm maiores chances de ocasionar alterações sexuais.
A amitriptilina e imipramina tem risco menor que a clomipramina, a nortriptilina é o tricíclico com menor riscos de efeitos colaterais dentre está classe de medicamentos. Os triciclicos são medicamentos de primeira linha de tratamento de diversos tipos de dor crônica, pela sua eficácia e segurança.
A duloxetina, outro medicamento que apresenta grande eficácia nos tratamentos de dor crônica, parece ter menores efeitos colaterais relacionada a disfunção sexual quando comparada a venlafaxina.
Mas, vale lembrar, que o uso da duloxetina é preferido em pacientes com depressão associada a dor e a venlafaxina nos pacientes com componente de ansiedade associado a dor.
Além disso, a mirtazapina é o medicamento antidepressivo, que pode ser usado no tratamento da dor crônica, com um menor potencial de disfunção sexual .
Mas porque um anti-depressivo pode causar alterações sexuais?
Devido sua ação no cérebro. Enquanto a dopamina melhora a função sexual, a serotonima inibe o desejo, a ejaculação e o orgasmo. Muitos antidepressivos atuam sobre a ação da serotonina no sistema nervoso central, em maior ou menor intensidade, explicando este efeito colateral.
A disfunção sexual é mais comum em homens com antecedentes de depressão, impotência e distúrbio ejaculatório e as mulheres tendem a tolerar melhor os efeitos colaterais que os homens.
O que fazer se o seu medicamento para dor estiver causando alguma disfunção sexual?
- Informe seu médico antes de suspender sua medicação, muitos fármacos não podem ser suspensos abruptamente, pois causam efeitos indesejavéis de retirada abrupta !
- Devemos investigar se a disfunção sexual não pode estar sendo causada devido uma depressão associada ao quadro de dor; Muitas vezes, é difícil saber o que está causando a disfunção sexual, a falta de desejo e disposição geral pode ser um sintoma comum tanto da depressão como em pacientes com dores de difícil controle! A avaliação médico psiquiatra é essencial!
- Avaliar se a dose do medicamento empregado não pode ser diminuída, já que está efeito é dose-dependente e se este medicamento for o causador deste distúrbio, mesmo com a diminuição da dose, avaliar se ele não pode ser trocado por outro;
- Avaliar se o distúrbio sexual não pode estar sendo causado por outro fármaco de uso contínuo do paciente como por exemplo medicamentos urológicos ou anti-hipertensivos;
- Avaliar se o abuso de drogas, especialmente o álcool e o fumo, não pode estar causando esta condição;
- Avaliar se não pode ser um sintoma residual após uma depressão resolvida!
Artigos sobre o assunto:
Yong Yang & Xuefeng Wang (2015): Sexual dysfunction related to antiepileptic drugs in patients with epilepsy, Expert Opinion on Drug Safety, DOI: 10.1517/14740338.2016.1112376
http://dx.doi.org/10.1517/14740338.2016.1112376
Amitriptyline and Sexual Function: A Systematic Review Updated for Sexual Health Practice
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5818113/pdf/10.1177_1557988317734519.pdf
The Safety, Tolerability and Risks Associated with the Use of Newer Generation Antidepressant Drugs: A Critical Review of the Literature
https://www.karger.com/Article/Pdf/447034
http://www.polbr.med.br/ano12/art1112.phpVerrotti A, Mencaroni E, Cofini M, Castagnino M, Leo A, Russo E, Belcastro V. Valproic Acid Metabolism and its Consequences on Sexual Functions. Curr Drug Metab. 2016;17(6):573-81. doi: 10.2174/1389200217666160322143504. PMID: 27000076.